Cachaça a bordo: “causo” curioso da nossa aviação comercial

MEMÓRIAS DO COMANDANTE: A CACHAÇA DO TONINHO

Por Thales Guaracy, no Almanaque Brasil

Em meados da década de 1990, a TAM encontrava-se no maior boom de crescimento de sua história, graças à sua entrada na era do jato, à aposta no vôo entre capitais a partir de aeroportos centrais e ao trabalho do comandante Rolim Adolfo Amaro para garantir o melhor serviço possível aos passageiros.

Rolim fazia qualquer coisa para agradar os clientes, de modo a deixar transparente sua filosofia segundo a qual o passageiro estava acima de tudo. Tornaram-se famosas suas tiradas para cortejar os clientes – tão famosas que se transformaram em motivo de piada.

Antônio Vidigal, dono de uma empresa de informática de Belo Horizonte, conhecido pelos amigos como Toninho, sabia disso perfeitamente. Por essa razão, ao tomar um vôo da TAM da capital mineira para o Rio de Janeiro, decidiu fazer uma aposta com um amigo com quem viajava, sentado na poltrona ao lado.

– O Rolim faz toda essa propaganda de que resolve qualquer problema do cliente… – disse Antônio. – Vamos fazer um teste.

– Qual?

– Quando vier a comissária servindo as bebidas, vou pedir cachaça. Vamos ver se eles têm.

Ficaram combinados. Quando veio a comissária, Toninho olhou, muito sério, e pediu:

– A senhorita tem cachaça?

A comissária, desconcertada, teve que dizer que não.

– Sinto muito, cachaça não temos.

Toninho virou-se para o colega e fez troça.

– Está vendo? – disse, triunfante. – Dizem que o Rolim faz tudo pelo cliente, mas nem cachaça ele põe no avião.

A comissária serviu os passageiros com outros drinques, depois de reparar na conversa entre ambos. E afastou-se.

Ao final da viagem, Toninho desceu a escada que dava para o tapete vermelho, símbolo da veneração ao cliente inventado por Rolim. Para sua surpresa, contudo, foi barrado por um funcionário da TAM no aeroporto Santos Dumont, que o esperava ao pé da escada.

– O senhor é o Antônio Vidigal? – perguntou.

– Sim, sou eu mesmo.

O funcionário, então, entregou-lhe um pacote.

– Vim lhe entregar esta encomenda, com os cumprimentos do comandante Rolim Amaro.

Toninho olhou para o colega. Abriu o pacote: lá estava uma legítima garrafa de cachaça mineira, embalada para presente.

Olhou para cima da escada. A comissária, por um instante antes de desaparecer dentro do avião, sorria.

* Thales Guaracy é romancista e escritor. Autor de O Sonho Brasileiro, biografia do fundador da TAM, comandante Rolim Adolfo Amaro, e dos romances O Homem que Falava com Deus (Editora Arx) e Filhos da Terra (Mandarim).

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