Alceu Valença entra na briga: forró vivo contra forró de plástico

Contra o "forró de plástico"

ALCEU VALENÇA e LUIZ GONZAGA, o LUA

A Cachaça da Happy Hour

O músico pernambucano Alceu Valença postou em seu site oficial um texto em defesa da postura assumida pelo compositor e secretário estadual de cultura da Paraíba, Chico César, de não apoiar oficialmente eventos de São João que tenham como atrações as bandas de “forró de plástico”.

Nessa categoria estão enquadrados grupos que usam equipamentos eletrônicos — como o Mastruz com Leite, Aviões do Forró, Ferro na Boneca, Saia Rodada e Caviar com Rapadura, por exemplo –, contrapondo-se ao forró mais tradicional. Enquanto um trio regional recebe menos de 300 reais por show, as bandas de “forró de plástico” (com suas dançarinas peladas e letras pornográficas) faturam cachês de até R$ 150 mil por cada apresentação de menos de duas horas.

Recentemente, durante um espetáculo, o monstro-sagrado Sivuca foi hostilizado pelo público. Ele, já velhinho, tocava sanfona em vez de teclado e não tinha moças seminuas dançando em seu palco. Vaias também recebeu o grande Geraldo Azevedo porque ele cantava Luiz Gonzaga e Jackson do Pandeiro em festa junina financiada pelo governo da Paraíba, enquanto o público, esperando a dupla sertaneja Zezé di Camargo e Luciano, gritava “Zezé, cadê você? Eu vim aqui só pra te ver”.

Veja abaixo a íntegra dos argumentos de Alceu Valença:

O FORRÓ VIVO!

Vejo com muito bons olhos – olhos atentos de quem há décadas observa os movimentos da cultura em nosso país – a iniciativa do Secretário de Cultura do Estado da Paraíba, Chico César, de “investir conceitualmente nos festejos juninos”, segundo comunicado oficial divulgado esta semana. Além de brilhante cantor e compositor, Chico tem se mostrado um grande amigo da arte também como um dos maiores gestores da cultura desse país.

A maneira mais fácil de dominar um povo – e a mais sórdida também – é despi-lo de sua cultura natural, daquilo que o identifica enquanto um grupamento social homogêneo, com linguagens e referências próprias. Festas como o São João e o carnaval, que no Brasil adquiriram status extraordinariamente significativo, tem sido vilipendiadas com a adesão de pretensos agentes culturais alienígenas mancomunados com políticas públicas mercantilistas sem o menor compromisso com a identidade de nosso povo, de nossas festas, e por que não, de nossas melhores tradições, no sentido mais progressista da palavra.

Sempre digo que precisamos valorizar os conceitos, para que a arte não se dilua em enganosas jogadas de marketing. No que se refere ao papel de uma secretaria ou qualquer órgão público, entendo que seu objetivo primordial seja o de fomentar, preservar e difundir a cultura de seu estado, muito mais do que simplesmente promover eventos de entretenimento fácil com recursos públicos. É preciso compreender esta diferença quando se fala de gestão de cultura em nosso país.

Defendo democraticamente qualquer manifestação artística, mas entendo que o calendário anual seja largo o suficiente para comportar shows de todos os estilos, nacionais ou internacionais. Por isso apóio a iniciativa de Chico em evitar que interesses mercadológicos enfiem pelo gargalo atrações que nada tem a ver com os elementos que fizeram das festas juninas uma das celebrações brasileiras mais reconhecidas em todo o mundo.

Lembro-me que da última vez que encontrei o mestre Luiz Gonzaga, num leito de hospital, este me pedia aos prantos: “não deixe meu forrozinho morrer”. Graças a exemplos como o de Chico César, o velho Lua pode descansar mais tranquilo. O forró de sua linhagem há de permanecer vivo e fortalecido sempre que houver uma fogueira queimando em homenagem a São João.

Visto no Movimento Cultura Brasil

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Blog da Nívia de Oliveira Castro

2 comentários em “Alceu Valença entra na briga: forró vivo contra forró de plástico

  • 12 de novembro de 2011 em 23:20
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    O Brasil tem grandes mestres, que fazem da nossa da música uma das mais variadas e bonitas do mundo: Luiz Gonzaga, Jackson do Pandeiro, Sivuca, Tom Jobim, grandes sambistas, poetas repentistas, os mineiros de todas as esquinas, muitos anônimos que, apesar de todo o potencial, vivem e morrem reduzidos a seus redutos. O secretário Chico Cesar foi muito feliz em sua defesa de nossos valores, ao afirmar que todos tem o direito de curtir o que quiserem, mas cabe ao Estado valorizar a música mais original e representativa de nosso povo. Neste sentido, e creio ser o mesmo pensamento do Alceu Valença, o carnaval do Recife deveria ter em seus palcos, primordialmente, aqueles que fazem do carnaval daquela cidade, de longe, o mais democrático e variado em ritmos de todo o Brasil.

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    • 12 de novembro de 2011 em 23:27
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      Concordo Aldo. Muito oportuna a lembrança sobre o democrático Carnaval de Recife. Abraço.

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