Sartre resgata o inesquecível espírito universal da contestação

A MÁQUINA DEMOLIDORA DE HIERARQUIAS

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O mundo comemora os 45 anos do Maio de 1968, o acontecimento revolucionário mais importante do século XX porque não se deveu a uma camada restrita da população, como trabalhadores ou minorias, mas a uma insurreição popular que superou barreiras étnicas, culturais, de idade e de classe. É uma ótima oportunidade para reverenciar um dos principais inspiradores do movimento libertário.

A PEDAGOGIA DA CONTESTAÇÃO

Por Simone Núñez Reis *

O filósofo francês Jean-Paul Sartre (1905-1980) afirmara que: “o homem contestador é capaz de construir outras formas de concepção e transmissão de saber”.

Esta e outras frases fizeram a diferença em sua própria trajetória como professor nos liceus (escolas) de Laon, Condorcet e Pasteur.

A faceta pedagógica de Sartre é descrita brilhantemente pela pesquisadora norte-americana Annie Cohen-Soal na biografia SARTRE (L&PM Pocket, 2005, 157 págs.).

Ela retrata um painel da vida filosófico-pedagógica de Jean-Paul Sartre, considerado um dos intelectuais mais relevantes do século XX.

A narrativa fidedigna de Cohen-Solal retrata o baú de jóias sartreanas ao exibir pérolas dos anos dourados que compuseram a carreira docente do intelectual.

Como no primeiro dia de aula em que Sartre desafiou as práticas educativas com sua nova pedagogia contestadora de hábitos. Igual a uma máquina de subversão, Sartre lecionava refratário às autoridades e hierarquias.

Filósofo francês

Aos 25 anos de idade, já lecionando em Havre, Sartre contrariou colegas ao fumar cachimbo, usar pulôver sem gravata e falar de improviso com as mãos nos bolsos sentado sobre a escrivaninha.

Segundo a obra de Cohen-Soal, Sartre dava passadas apressadas até a sala de aula onde praticava uma didática que tratava os adolescentes como adultos. Aulas que abordavam de Santo Anselmo à Kant, da burguesia de Havre ao Cinema Novo.

Comparado a um jogador de pingue-pongue, Sartre é descrito como um incentivador de discussões dentro e fora de aula, onde indicava a leitura de romances policiais norte-americanos aos alunos.

No capítulo IX a autora revela que Sartre gostava dos alunos criativos, inquietos e críticos.

Órfão de pai e educado pela mãe e avós até os onze anos ficou afastado dos bancos escolares, mas recebeu instrução do avô — alemão e pedagogo aposentado.

Em maio de 1968,o discurso de Sartre emerge para comunidades operárias e diretórios estudantis nos quais analisava a crise universitária.

Neste contexto Sartre declarou ser necessário que professores fizessem a cultura chegar até as massas populares e sugere o uso de novas metodologias de ensino para compreender melhor os alunos.

Sartre surge então como pai da contestação, através de sua personalidade ética, solidária e epistemológica.

Sartre contestador

Longe de ser ingênuo ou cínico, Jean Paul Sartre lançou-se com atrevimento e coragem na luta de classes, que lhe configurou um estilo libertário e revolucionário em relação à cultura tradicional.

Sartre impôs sem censuras, escrúpulos ou reticências uma atuação subversiva, firme e arrogante. Ensinou como construir a soberania estudantil, agitou Paris em 1968.

Seu olhar conferiu dignidade e legitimidade intelectual à educação, abolindo a hipocrisia acadêmica dos moldes tradicionais.

Sartre escreveu novos capítulos ao movimento estudantil que ganhou mais fôlego. Encerrou sua carreira pedagógica em 1944, continuando algum tempo próximo aos adolescentes.

A obra de Cohen-Solal sensibiliza seus leitores em trechos como este: (…) Sartre jamais reivindicou poder, superioridade ou hierarquia em nome do saber, mas sua vida ilustrou a contestação em nome deste suposto poder: O saber que Sartre tanto praticou com liberdade (…)

SARTRE é leitura obrigatória a todos que pretendem resgatar o inesquecível espírito universal da contestação.

Que cada dia ressuscite um contestador sartreano em cada um de nós! Vale muito a pena ler!

* Simone Núñez Reis é jornalista e psicopedagoga em Porto Alegre – RS

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