Ódio, racismo e bullying midiático contra um povo

Do Blog Chefe de Redação

Cassetas, Planetas, CQCs e outras trupes midiáticas usam o preconceito e a discriminação para constituir o “humorismo de desqualificação”, rasteiro, agressivo e altamente viral. Se existe nestes “midiotas” a adoração servil pelas potências do Norte, há também o gosto em escarnecer o país vizinho. É uma forma de “bullying” transnacional tão insistente quanto venenoso. Desta vez o ataque covarde não teve origem nos programas de piadas ruins, mas na emissora Sportv, da Rede Globo.

Bandeira do Paraguai - Azul, Vermelha e Branca

A BRUTAL AGRESSÃO DA GLOBO AO PARAGUAI

Por Mauro Carrara *

Se a América Latina é forte, resistente, mais ainda é o Paraguai.

Em inúmeras ocasiões, sofreu ataques pesados dos vizinhos cobiçosos.

Eliminaram suas linhas de comunicação com o mundo. E o país restou sem saída para o mar.

Como em outras partes do coração do Cone Sul, no entanto, desenvolveu comunidades sustentáveis e harmônicas nas reduções jesuíticas, espaço da colaboração fraterna entre o europeu esclarecido e o indígena do interior do continente.

Eram esses agrupamentos civilizados que sofriam ataques bárbaros dos “bandeirantes”, aventureiros que viviam de fazer escravos, mas que acabaram sacralizados como heróis na mitologia brasileira, especialmente a paulista.

No século XVIII, a grande obra da potências européias foi a destruição da república comunal cristã dos guaranis.

Como tolerar que aqueles povos da floresta, tão cândidos e belos, fossem também ótimos fundidores, sapateiros, alfaiates, ceramistas, tecelões, relojoeiros, calígrafos e fabricantes de instrumentos musicais?

Guerra do Paraguai - destruiçãoEsta parte do Paraguai guarani, que era também brasileiro e argentino, foi destruída cruelmente. E seus melhores cidadãos, homens e mulheres, foram convertidos em escravos, servidores ou soldados.

A saga do povo paraguaio continua depois, resistindo à tentativa de anexação por parte da Argentina.

Entretanto, no século XIX, expressivas partes do território acabam cedidas aos vizinhos insaciáveis.

Entre 1865 e 1870, Argentina, Brasil e Uruguai, com suporte do Reino Unido, cercam e atacam ferozmente o Paraguai.

Campos são incendiados. Rios são contaminados.

Ao fim do conflito, mais da metade dos 500 mil paraguaios perderam a vida. Dois terços da população masculina foi sepultada nesses anos de terror.

E boa parte dos território acabou surrupiado por argentinos e brasileiros.

Espetacularmente, o Paraguai resistiu, e manteve-se como nação independente, nação singular.

Ainda hoje, 95% da população fala o guarani. São resistentemente bilíngues, peculiarmente atados a suas raízes, singularmente adeptos da diversidade e da mestiçagem.

Este sofrido, mas valente e belo país, costuma ser alvo de chacotas e insultos, especialmente no Brasil.

Cassetas, Planetas, CQCs e outras trupes midiáticas valem-se do preconceito e da discriminação para constituir o chamado humorismo de desqualificação, sempre rasteiro, agressivo e altamente viral.

Se existe nestes midiotas verdadeira adoração servil pelas potências do Norte, há também enorme gosto em escarnecer e provocar o país vizinho. Trata-se de uma espécie de bullying midiático transnacional tão insistente quanto venenoso.

Povo indígena do ParaguaiDesta vez, no entanto, o ataque covarde não teve origem nos programas de piadas ruins, mas na emissora Sportv, da poderosa Rede Globo.

Em vez de esmiuçar a excelente campanha do selecionado paraguaio, eliminado da Copa da África do Sul num jogo em que teve um gol legítimo anulado, os globais preferiram o lugar-comum estupidificante para ofender mais uma vez o povo vizinho.

Combinando imagens pinçadas e um texto cheio de ironias rasas, o “jornalista” da Globo chama o Paraguai de “paraíso obscuro do mundo”.

Sua poesia de desqualificação segue afiada. Ridiculariza a gastronomia, a economia e a música locais. E chega a zombar das fisionomias dos paraguaios e paraguaias, num indisfarçado exercício de racismo.

Segue, aliás, o discurso ofensivo contra os vizinhos latinoamericanos, potencializado com as recentes agressões do político José Serra ao povo boliviano.

Se o futebol vem sendo propagandeado como instrumento do processo civilizatório, a Rede Globo de televisão o utiliza exatamente com propósito contrário.

Nas mãos e bocas da imprensa brasileira, o esporte bretão torna-se um recurso de perpetuação do preconceito ignominioso e do desprezo pela diferença.

Como brasileiro, me envergonha. Se vale alguma coisa, rogo aos irmãos paraguaios que aceitem nossas desculpas.

É responsabilidade nossa, dos brasileiros de bem, mas tristemente omissos, que a emissora líder continue a cometer desvarios dessa natureza.


* Mauro Carrara é jornalista, nascido em 1939, no Brás, em São Paulo. É o segundo filho de Giuseppe Carrara, professor de Filosofia em Bologna, e de Grazia Benedetti, uma operária e militante comunista de Nápoli. O casal chegou ao Brasil em 1934, fugindo da perseguição fascista. Mauro foi para a Itália em 1959, por sugestão do amigo dramaturgo G. Guarnieri. Em Firenze, estudou arte, ciências sociais e comunicação. De volta ao Brasil, passou dois anos na Amazônia. Ao atuar na defesa dos povos indígenas, foi preso pelo regime militar. Libertado, voltou à Itália. Como free-lancer, produziu reportagens para jornais como L’Unita e Il Manifesto. Com o primo Antonino, esteve no Vietnã, no início da década de 70. Em 1973, no Chile, juntou-se à resistência ao golpe contra Allende. No Brasil, como clandestino, aproximou-se do cartunista Henfil, cujos trabalhos traduziu para uma revista alternativa italiana. Na década de 80, prestou serviços para a ONU em países como China, Iraque e Marrocos. Nos anos 90, assessorou ONGs brasileiras, especialmente na área de Direitos Humanos. Ainda atua na área de comunicação e relações internacionais.

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Blog Chefe de Redação

6 comentários em “Ódio, racismo e bullying midiático contra um povo

  • 30 de junho de 2011 em 19:19
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    Boa noite Sr. Paulo Maurício Machado, soy Nancy, paraguaia, residente no Brasil.

    Gostei muito do seu comentário sobre o Paraguai, assim que tomei conhecimento não duvidei em procurar o senhor para agradecer sua sensibilidade para com nosso povo.

    Deixo meus contatos pessoais e também de nosso Núcleo Cultural que luta contra este terrível preconceito que nos atinge a todos nós de nacionalidade paraguaia no Brasil.

    Também difundimos nossa cultura para demostrar que o Paraguai é muito mais do que a mídia no Brasil conta para o povo brasileiro.

    Abraços e muito agradecida pelas suas palavras.

    http://paraguaiteete.wordpress.com/discriminacao-no-brasil/

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  • 8 de julho de 2010 em 08:22
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    Carta da ministra do turismo paraguaia, Liz Cramer, em que REJEITA o pedido informal de desculpas da rede globo pela enorme C@G@D@:

    “Escrevo na qualidade de ministra do Turismo do Paraguai, em relação ao material em que vosso programa pede desculpas ao nosso país pela patética e ofensiva reportagem veiculada recentemente.

    Como profissionais do mundo da comunicação, com o poder de vossa rede e a imensa audiência que têm, vocês saberão entender que o pedido de desculpas não é suficiente. O impacto daquelas imagens é muito superior ao impacto de um pedido de desculpas com uma nota positiva.

    Assim, estão convidados o editor e os apresentadores e o locutor do material para que venham a conhecer-nos e surpreenderem-se com este país e a derrubar preconceitos, para que depois façam uma reportagem justa sobre o que terão vivido aqui.

    Insisto que aceitem o convite, porque merecemos que vossa audiência conheça nossa riqueza como nação, como destino turístico e como um país com uma dignidade que supera de longe o futebolístico. Asseguro que sairão do Paraguai convencidos de nosso valor”.

    Liz Cramer

    Ministra do Turismo

    República do Paraguai

    CALA A BOCA REDE GLOBO!!!

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  • 6 de julho de 2010 em 21:37
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    Os paraguaios mandaram “a letra” em cima da esculhambação que a Globo fez com o país deles. Ô povo raçudo esse! Enquanto isso, aqui fica todo mundo “botando o galho dentro” pra essa máfia que controla as comunicações no país. Acorda, povo brasileiro!

    Embajada de la República del Paraguay

    Brasilia-DF, 2 de julio de 2010.

    Ref.: Publicación de SporTV.

    Señor Director:

    Me dirijo a Usted con el objeto de manifestarle nuestro desagrado por un video exhibido en una programación del Canal de Televisión SporTV, miembro del grupo periodístico de su Dirección, relacionado con la participación de la Selección paraguaya en el Mundial de Futbol Sudáfrica 2010.

    Expresamos nuestro rechazo a la difusión de un material que, con un supuesto tono humorístico, denigra al pueblo paraguayo, ironizando sobre nuestros valores culturales y atractivos naturales.

    No podemos comprender el objetivo de dicha publicación y menos aún cuando ello ocurre de parte de un medio periodístico prestigioso que no necesita recurrir a la infamia para ganarse mayor audiencia.

    Estamos muy satisfechos del lugar que actualmente ocupa nuestra selección en el Mundial de Sudáfrica y más aún por el hecho de ser una de las 4 selecciones de América, coincidentemente pertenecientes a los 4 Estados Partes del MERCOSUR, que han arribado a estas instancias en tan importante certamen deportivo.

    Tenemos legítimo orgullo de nuestras costumbres y tradiciones, así como de nuestros recursos y atractivos turísticos, por lo que una publicación de indiscutible mal gusto, como la referida, no conseguirá menoscabar el lugar ganado con mucho esfuerzo en el deporte ni los valores de pueblo y naturaleza de nuestro país.

    Por tratarse de una reiterada falta de respeto en el mismo medio televisivo, me permito solicitarle que la programación del grupo periodístico de su dirección, respete la dignidad del pueblo y gobierno de la República del Paraguay.

    Atentamente,

    Didier César Olmedo

    Ministro de Embajada

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  • 5 de julho de 2010 em 22:20
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    “Em comum, todos têm um sorriso permanente estampado no rosto. Sorriso plastificado. Nem disfarçam mais, fazendo “cara de conteúdo”. Difícil discernir entre os locutores que fazem televendas, os humoristas do CQC e os telejornalistas encarregados das coberturas esportivas. Eles estão permanentemente de bom humor e tratam o telespectador como um imbecilóide, como a criança que recém migrou do show da Xuxa para a adolescência das coberturas esportivas e que, se tudo der certo, em breve se tornará bovinamente “consumidor de notícias” do Jornal Nacional.

    O mais curioso é que os mentores dessa imbecilização generalizada se alimentam de preconceitos antigos para suas “sacadas” modernosas. Nascem daí momentos imperdíveis de nosso telejornalismo, como o que o SporTV produziu sobre o Paraguai, a título de fazer uma graça. Houve, sim, um tímido pedido de desculpas (mas eles continuam pensando a mesma coisa sobre o Paraguai, só lamentam não poder dizer isso em voz alta). É produto genuinamente brasileiro, como a jabuticaba: um tele-entretenimento jornalístico que ganha dinheiro reproduzindo a própria ignorância.”

    Do Luiz Carlos Azenha:
    http://www.viomundo.com.br/opiniao-do-blog/como-ganhar-dinheiro-vendendo-a-propria-ignorancia.html

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  • 5 de julho de 2010 em 20:58
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    O mais importante jornal paraguaio, o La Nación, publicou com destaque em sua edição online mensagem do blogueiro Eduardo Guimarães, do Blog da Cidadania, prestando solidariedade ao povo do Paraguai em nome de todos os brasileiros.
    Na nota ele denuncia o papel criminoso da Globo em sua doutrina visando desagregar os povos sulamericanos. Muito bacana a atitude do EduGuim. Eu assinaria em baixo.

    http://www.lanacion.com.py/noticias_um-314740.htm

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  • 5 de julho de 2010 em 18:03
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    Acho que essa foi uma das melhores homenagens que se podia prestar ao povo irmão paraguaio, tão covardemente ofendido. De uma maneira sensível: mostrando a bandeira, o povo nativo, o crepúsculo… tudo lindíssimo, além do texto, claro, com a indignação dos justos.
    Parabéns. Lu.

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