Mulheres gordas não têm vez, só as muito magras… na França

ONDE REINA A TIRANIA TOTAL DAS MAGRAS

Mulher magra e chique

Comparativos não faltam por lá: mulher não é ‘gorda’, ela é chamada de ronde, robuste, forte, solide, dodu, rondelette – roliça, robusta, forte, sólida, rechonchuda, fofinha. E pode até mesmo ser enrobee, um adjetivo que descreve uma cobertura grossa de chocolate em doces e bolos, mas que neste caso se refere a uma mulher que é bem coberta com a sua própria massa. É a tirania absoluta das magricelas.

O DRAMA DE SER UMA MULHER GORDA NA FRANÇA

Há décadas a imagem da mulher parisiense chique e esbelta é o padrão e epítome do estilo na França, mas ela também faz com que algumas mulheres francesas se sintam inadequadas.

Isabelle, de 50 anos, diretora de uma galeria de arte da moda em Paris, diz: “É simples. Chique + Magra = Sucesso”, ao se referir sobre os corpos femininos.

“É assim que funciona para as mulheres aqui”, explica. “Se você for gorda, não conseguirá aquele emprego. Mas se tiver a silhueta – chique, muito magra, elegante – você está mais ou menos ‘feita’”.

Isabelle é uma rara exceção à regra – ela é bastante gorda – mas, por ser autônoma, ela diz que consegue escapar do padrão e que gosta de estar acima do peso em uma sociedade tão obcecada com a magreza e a conformidade.

“Ser gorda me faz sentir livre, mesmo que nunca consiga encontrar nada para usar nas lojas de Paris. Eu me lembro da última vez em que tentei, sob o olhar de horror no rosto da vendedora”, conta.

“Ela disse: ‘Senhora, com certeza não temos nada para você aqui’”, relata.

TOLERÂNCIA ZERO CAL

Diz-se que toda mulher francesa acha que precisa perder pelo menos dois quilos, e a indústria do emagrecimento na França é enorme.

As farmácias estão cheias de produtos de dieta que se proclamam milagrosos, e as revistas femininas têm extensas colunas de conselhos para emagrecer.

A maior parte da pressão que sentem para ser magras vem de outras mulheres francesas e de uma sociedade que tem tolerância zero à gordura.

A mulher não é “gorda”, ela é chamada de ronde, robuste, forte, solide, dodu, rondelette – roliça, robusta, forte, sólida, rechonchuda, fofinha.

E pode até mesmo ser enrobee, um adjetivo que também é usado para descrever uma cobertura grossa de chocolate em doces e bolos, mas que neste caso se refere a uma mulher que é bem coberta com a sua própria massa.

Existe ainda uma ideia veiculada no que os franceses chamam de “imprensa anglo-saxônica” de que as mulheres francesas não engordam.

RECEITA MÁGICA

Elas seguiriam apenas uma série de regras místicas, passadas de mãe para filha, que conduzem a manutenção de sua aparência, comportamento e, principalmente, hábitos alimentares.

Uma dieta sensata e balanceada. Muitos produtos frescos. Três refeições por dia. Absolutamente nenhum lanche. Exercícios regulares. Nada em excesso.

É o que qualquer mulher ocidental educada ensinaria às suas crianças – mulheres e homens – seja qual for sua nacionalidade.

Muitas mulheres seguem este regime e mantêm corpos saudáveis e razoavelmente magros, mas para ter esta silhueta tão magra, algumas precisam praticamente passar fome.

Há muitas famílias parisienses de classe média que se reúnem para uma refeição frugal de vegetais cozidos e uma xícara de chá de ervas à noite para evitar ganhar peso.

ESPARTILHO MENTAL

“Não há mistério. É claro que mulheres francesas engordam”, diz Sonia Feertchak, editora-chefe da publicação L’Encyclo des Filles (Enciclopédia das Garotas), um popular guia de saúde e beleza para adolescentes.

“Mas a questão é que elas não têm coragem (de engordar), e algumas até passam fome, porque nesta sociedade ser uma mulher gorda é ser um fracasso”, afirma.

Segundo Feertchak, mulheres gordas são vistas como “estúpidas” e julgadas como “perdedoras feias e esquisitas”.

“As mulheres chegaram tão longe na França – temos voz política, creches de qualidade, acesso ao trabalho – mas ao invés de estarmos mais confiantes, estamos cada vez mais obcecadas com nosso peso e nosso corpo”, afirma.

“Coco Chanel nos libertou do espartilho há mais de 80 anos, mas ficamos à mercê de um ‘espartilho mental’ – uma silhueta de suposta perfeição que é inalcansável e leva à tristeza e aos distúrbios alimentares”, diz.

TIRANIA DA SILHUETA

Para qualquer lugar que se olha em Paris ela está lá, a mulher francesa idealizada, posando glamurosamente em ônibus, outdoors e anúncios em estações de metrô.

Ela é frágil e muito magra; anuncia tudo, de lingerie a descontos em seguros de carro e até comida – um sorvete, talvez, ou um delicioso queijo francês colocado provocantemente fora do alcance, por pouco, de sua bela boca semi-aberta.

“É uma tirania absoluta, que chamamos de tirania da silhueta, mas é também uma espécie de sonho, porque representa o sucesso total”, diz Marjorie, uma executiva de 49 anos, que é também muito magra.

“Não é como na Inglaterra, onde os programas de TV mostram mulheres de todos os volumes. Eu adoro isso – mulheres rechonchudas de 55 anos beijando homens na boca. Eu nunca veria isso aqui”, afirma.

Marjorie trabalha próximo ao subúrbio de Saint Denis, em Paris, onde há uma grande população de imigrantes do noroeste da África.

Ela se inspira naquelas mulheres, com seus corpos cheios e curvilíneos, na maneira como andam altivas.

“Elas são tão mais femininas do que a nossa ‘chique parisiense’, mas a triste verdade é que se elas querem seguir carreiras nesta sociedade, terão que ficar magricelas para conseguir”, conclui.

No DCM

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