Edward Hopper: crítica sensível sobre as cenas do cotidiano

CHAIR CAR (1965): QUE ISOLAMENTO É ESSE?

Pinturade Edward Hopper

Por José Aloise Bahia *

Escrever sobre Edward Hopper (1882-1967) nos leva a citação de Degas: “É muito bom pintar tudo o que se vê, mas pintar o que ficou na memória é muito melhor”.

As transposições de Hopper podem ser descritas (observação do próprio pintor) como a “morte total”, que faz lembrar o simulacro total, tão bem descrito, estudado, analisado e refletido no livro América de Jean Baudrillard, na década de 1980.

Aguça a matiz da memória aquilo que a solidão impera de maneira explícita: a morte da ideia original.

O realismo do artista americano, seus contextos fechados na autonomia do quadro, estimula e reelabora as percepções dos observadores em torno da questão da morte total, pois, observa-se a partir da geometria, na imagem da tela acima, uma aparente calma preenchida de isolamento, nos quais se destacam artifícios e personagens “abonecados”, cujos rostos desbotam nas sombras.

O trato com a luz, diálogos com a fotografia e o cinema, congelam as figuras, dando uma sensação de retraimento, uma presença ausente, oximoro e simulação encharcadas de verde: um branco encardido bate à porta sem a fechadura, trazendo na bagagem as janelas e o estrondo do Modernismo. Mesmo assim, qualquer observador poderá perguntar que isolamento é este?

Um tipo de (in)sensibilidade/(in)diferença que contrasta o motivo em relação às cores; o não intercâmbio do claro-escuro previamente definidos; a intervenção assinalada num palco mudo de um mundo já totalmente sem esperança, asfixiado, e padecendo da falta de comunicação; a morte da ideia original de uma civilização atormentada na sua contraditória tranquilidade.

Hopper é o pintor das ilusões perdidas. Além de meras representações com status diferenciados, muito além, seus quadros sempre atuais revelam o entorpecimento e a carência do homem moderno e contemporâneo. Reelabora o real pela força da sua imaginação e memória, atravessando o tempo/espaço com uma visão pictórica tensionada pelas ideias da sociedade de consumo e uma crítica sensível sobre as cenas do cotidiano.

Não tem como não concordar com Clemente Greenberg: “Hopper é, muito simplesmente, mau, mas se fosse melhor pintor, não seria provavelmente um artista tão bom”.

* José Aloise Bahia (Belo Horizonte/MG) é Jornalista, escritor, pesquisador, ensaísta, colecionador e crítico de artes plásticas e literatura.

Um comentário em “Edward Hopper: crítica sensível sobre as cenas do cotidiano

  • 5 de março de 2013 em 20:06
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    O verde, o limbo das covas. Mortos vivos e não há poucos.

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