Aposta suicida do capital em benefício próprio contra a Humanidade
A COMILANÇA INSACIÁVEL DOS BANCOS
O crime de lesa-humanidade praticado pelos grandes bancos, sob o comando do Goldman Sachs, contra o desinformado povo grego e em vias de se consumar contra a indefesa população portuguesa só tem paralelo na história contemporânea ocidental com o crime de lesa-pátria cometido pela direita neoliberal tupiniquim, durante o período da privataria tucana.
Ao contrário do que ocorre agora com as duas — outrora poderosas e independentes — nações europeias, nosso país só não foi completamente para o vinagre por dois motivos: porque o Brasil era grande demais para quebrar e também devido ao singelo fato de que, até prova em contrário, Deus ainda é brasileiro — conforme a irreverência popular.
Para compreender como agem as instituições criminosas disfarçadas sob o codinome “bancos” é importante a leitura do artigo a seguir. Mesmo quem não é muito afeito aos complicados temas econômicos vai entender didaticamente como é operada a maracutaia. Até para se prevenir do tsunami monetário que a máfia financeira internacional já disparou contra o Brasil.
COMO O GOLDMAN SACHS AJUDOU A QUEBRAR A GRÉCIA
por Eduardo Febbro *
Há empresas que roubam para o império para o qual trabalham. A Goldman Sachs é uma delas.
O banco de negócios norteamericano encheu seus cofres com um botim de 600 milhões de euros (800 milhões de dólares) quando ajudou a Grécia a maquiar suas contas a fim de que este país preenchesse os requisitos para ingressar na zona do euro, a moeda única europeia.
A informação não é nova mas, até agora, se desconheciam os detalhes mais profundos do mecanismo pelo qual o Goldman Sachs enganou todos os governos europeus que participavam da criação da moeda única.
O porta estandarte da oligarquia financeira operou protegido por sólidas cumplicidades no seio das instituições bancárias europeias e dentro do poder político, que fez tudo o que esteve ao seu alcance para impedir as investigações.
Dois dos protagonistas desta mega fraude falaram pela primeira vez sobre as transações encobertas mediante as quais Atenas escondeu o tamanho de sua dívida. Trata-se de Christoforos Sardelis, chefe do escritório de gestão da dívida grega entre 1999 e 2004, e de Spyros Papanicolaou, o homem que o substituiu até 2012.
O resultado da operação foi uma gigantesca fraude que fez do suposto salvador, no caso o Goldman Sachs, o operador da derrocada da Grécia e de boa parte da Europa.
Levando-se em conta somente os bancos franceses, a aventura grega custou 7 bilhões de euros : o BNP Paribas perdeu 3,2 bilhões, o Crédit Agricole, 1,3 bilhões, a Société Générale, 892 milhões, o BPCE, 921 milhões e o Crédit Mutuel, 359 milhões.
Esse foi o custo só para o sistema bancário francês : os povos pagaram e pagarão em sacrifícios e privações muito mais do que isso.
MAQUIAGEM FINANCEIRA
A operação financeira foi astuta. O Tratado de Maastricht, que instituiu a União Europeia, fixava requisitos rígidos para integrar o euro : nenhum membro da zona euro podia ter uma dívida superior a 60% do PIB e os déficitis públicos não podiam superar os 3%.
Em junho de 2000, para ocultar o peso gigantesco da dívida grega que era de 103% de seu PIB e obter assim a qualificação da Grécia para entrar no euro, o Goldman Sachs bolou um plano : transportou a dívida grega de uma moeda a outra.
A transação consistiu em mudar a dívida que estava cotada em dólares americanos e em ienes japoneses para euros, mas com base em uma taxa de câmbio fictícia. Assim se reduziu o endividamento grego e, com isso, a Grécia respeitou os critérios fixados pelo Tratado de Maastricht para ingressar no euro.
Um detalhe complicou a maquiagem : o Goldman Sachs estabeleceu um contrato com a Grécia mediante o qual dissimulou o acerto sob a forma do que se conhece como um SWAP, um contrato de câmbio para os fluxos financeiros que equivale a uma espécie de crédito.
Esse esquema fraudulento fez com que, na base dos chamados “produtos derivados” [ou derivativos] implicados na operação, em apenas quatro anos a dívida que a Grécia contraiu com o Goldman Sachs passasse de 2,8 bilhões de euros para 5,1 bilhões!
Dois jornalistas da agência Bloomberg, Nick Dunbar e Elisa Martinuzii, realiazaram uma paciente investigação ao término da qual desnudaram ester obscuro mecanismo.
Segundo explicou aos jornalistras o chefe do escritório de gestão da dívida grega entre 1999 e 2004, Christoforos Sardelis, neste momento a arquitetura da proposta do Goldman Sachs escapou de suas mãos. Logo em seguida, disse Sardelis, os atentados de 11 de setembro e uma má decisão dos bancos plantou a semente do desastre atual.
A conclusão da investigação é contundente: Grécia e Goldman Sachs hipotecaram o futuro do povo grego e acionaram uma bomba relógio que, 10 anos mais tarde, explodiria nas mãos da sociedade.
CUMPLICIDADE NA IMPUNIDADE
Em matéria de grandes fraudes organizadas por bancos de investimento a impunidade é a regra. Ninguém foi nem será condenado. Christoforos Sardelis afirmou que “o acordo com o Goldman Sachs é uma história muito sexy dentre dois pecadores”.
O Goldman Sachs obteve apetitosos lucros nesta operação truculenta. No entanto, o banco de negócios norte-americano afirma em sua defesa que não fez nada de ilegal, que tudo o que foi realizado respeitava ao pé da letra as diretrizes do Eurostat, o organismo europeu de estatísticas.
O Eurostat, por sua vez, alega que só tomou conhecimento em 2010 dos níveis de endividamento grego. A defesa parece pobre porque as primeiras denúncias sobre a maquiagem das contas gregas e o papel desempenhado pelo Goldman Sachs datam de 2003.
Em um informe de 2004, o Eurostat escreveu : “falsificação generalizada dos dados sobre o déficit e a dívida por parte das autoridades gregas”.
Graças à cumplicidade do organismo financeiro norteamericano e de várias instâncias e personalidades europeias, a Grécia pode dissimular durante vários anos o “pacote” escondido de sua dívida. Em 2010, Jean Claude Trichet, então presidente do Banco Central Europeu (BCE), se negou a entregar os documentos requeridos para que fosse conhecida a amplitude da verdade.
MERCENÁRIOS NEOLIBERAIS
No meio a esta grande mentira, há uma personagem que hoje é central : trata-se de Mario Draghi, o atual presidente do Banco Central Europeu e grande partidário de terminar de uma vez por todas com o modelo social europeu.
Draghi é um homem do Goldman Sachs. Entre 2002 e 2005 foi vice-presidente do Goldman Sachs para a Europa e, por conseguinte, estava ao par da falsificação de dados sobre as finanças públicas da Grécia. Foi o seu próprio banco que estruturou a falsificação.
O liberalismo premia muito bem seus soldados.
Durante dois anos, o Banco Central Europeu e os lobbys políticos usaram todos os truques possíveis para proteger Draghi e não permitir que fossem realizadas auditorias em torno das irregularidades cometidas na Grécia. As comissões do Parlamento europeu designadas para investigar esta mega-fraude se chocaram sistematicamente contra as redes que protegiam o segredo.
O desenlace final desta cumplicidade entre as oligarquias financeiras é conhecido por todos: quase um continente submerso na crise da dívida, a Grécia estropiada e de joelhos, recessão, demissões massivas, perda de poder aquisitivo para os trabalhadores, reestruturações, sacrifícios dos benefícios sociais, planos de ajuste e miséria.
Enquanto isso, os 600 milhões que o Goldman Sachs ganhou com esta fraude seguiram dando frutos na aposta suicida que o capital faz em benefício próprio contra a humanidade.
* Na Carta Maior, com tradução de Katarina Peixoto